28 outubro 2019

Não julgue um livro pela capa... Não julgue um menino pela cara...

Extraordinário
texto: R. J. Palacio
ilustrações/Capa: Tad Carpenter
tradução: Rachel Agavino
editora: Intrinseca

Sei que esse é um livro que a maioria já conhece, e se não o leu ainda provavelmente já assistiu sua adaptação para o cinema. Mesmo assim, sei que ele é perfeito para o meu retorno ao Cachinhos. Extraordinário é especial demais para mim, e não faltam motivos para isso.

Eu já tinha visto sua capa algumas vezes nas livrarias, físicas e virtuais, mas confesso que nunca me interessei por ele. Novamente meus preconceitos idiotas! Associei, sabe-se lá porquê, a algumas coleções de livros bobos para adolescentes que tinha tido contato antes. Tem muita coisa ruim sendo publicada para esse público, não muito diferente do que acontece com os infantis, e o motivo é quase sempre o mesmo: subestimar as crianças e adolescentes, tratando-os como incapazes de compreender ou aproveitar uma leitura inteligente e/ou sensível. Nem tenho paciência para isso. De qualquer modo, no final das contas, a boba fui eu, de ter perdido a oportunidade de conhecer antes esse livro lindo. Ainda bem que a vida deu uma mãozinha e arranjou um jeito maravilhoso dele chegar até mim.

A filha e um coleguinha da escola estavam fazendo um curso juntos nas manhãs de sábado. Nós e a mãe do menino nos revesávamos numa carona solidária, e naquele dia acertamos que seríamos nós a levá-los e buscá-los, já que precisávamos levar o carro à oficina que ficava perto do curso. Pois bem, os deixamos na porta do curso, e ele acabou deixando no carro um livro que tinha pego na biblioteca da escola, e eu o fiquei folheando enquanto o marido dirigia até a oficina. Seriam algumas horas até o serviço terminar e irmos pegá-los novamente. E foi por puro tédio que comecei a ler Extraordinário, sentada em um banquinho de plástico, entre mecânicos e peças de carros.

O livro traz a história de August, um menino diferente. Portador de mutações raras, ele tem uma síndrome que deixou seu rosto disforme. Para além da sua aparência, Auggie teve que lutar pela vida desde que nasceu, e as diversas cirurgias que fez, além de garantir melhor qualidade para sua vida, como a capacidade de respirar e se alimentar sem a ajuda de aparelhos, o deixaram longe da escola durante os seus primeiros 10 anos. É nesse ponto que a história começa, com a estabilidade do seu quadro clínico e a possibilidade de ele ingressar numa escola regular.

Mesmo quem não leu o livro ou assistiu o filme pode imaginar os desafios que um menino de 10 anos que até então só tinha tido aulas em casa com a mãe e tem um rosto que causa reações de medo, repulsa e até nojo, teve ao entrar no 5º ano de uma escola tradicional. Mas preciso contar o que me deixou mais encantada com a história de R. J. Palacio: a proposta de contar uma história tão forte quanto essa pela versão dos seus diferentes personagens. Simplesmente amo esse tipo de abordagem. Assim, o livro é estruturado em oito partes, três com a narração de August, e cinco a partir da visão de outros personagens, como sua irmã Via; o namorado dela, Justin; a amiga de Via, Miranda; e Summer e Jack, amigos novos da escola de Auggie. Perceba que nenhum dos narradores é adulto! Toda a história é contada por personagens na infância e adolescência.

Achei essa proposta fantástica por dois motivos. Primeiro porque nos lembra que tudo que acontece tem sempre pelo menos dois lados - na verdade tantos lados quanto forem as pessoas envolvidas naquilo. Então é possível entender melhor o que leva alguém a uma atitude cruel ou egoísta, ou a uma atitude de fraqueza ou covardia. Me fez lembrar como precisamos de muito mais empatia para entender os acontecimentos da vida sem julgamentos e injustiças.

O segundo motivo é porque, embora a história toda gire em torno de August e sua trajetória pelo seu primeiro ano de escola, cada personagem traz sua versão cheia de questões próprias, e então o foco não fica tão pesado sobre ele. A história é leve e cheia de possibilidades. Não é a síndrome ou o rosto de Auggie, é como cada um, de acordo com suas memórias e bagagens, medos e angustias, encara a sua relação com ele, e como isso se conecta com diversos outros fatos de suas vidas. Não é simplesmente um livro sobre bullying, ou sobre os sofrimentos de uma pessoa com uma síndrome rara, é um livro sobre sentimentos, sobre relacionamentos, e sobre exercitar se colocar no lugar do outro. Adoro lembrar que esse emaranhado tão sensível e complexo foi pensado para o público infanto-juvenil, com todo o respeito e seriedade que eles merecem!

Fonte: www.intrinsica.com.br

Preciso dizer que a história de August rendeu outros três ótimos livros. Auggie e Eu eu comprei logo depois de ler o primeiro, absolutamente empolgada com a história. Mas como bem destaca a autora, não se trata de uma continuação do primeiro livro, mas a versão da mesma história contada por três personagens importantes que não tiveram voz na primeira publicação: Julian, o garoto que desencadeia uma sequência de crueldades com Auggie; Christopher, o seu primeiro amigo e Charlote, uma amiga da escola que sempre se manteve "neutra". O  Somos Todos Extraordinários é uma versão mais infantil, abordando o tema de uma maneira ainda mais leve para os menorzinhos. Já o 365 dias extraordinários traz 365 preceitos do sr. Browne, o maravilhoso professor de Auggie. Nem preciso dizer que ele rendeu também um filme, que é lindo, emocionante, e fico feliz em dizer, extremamente fiel ao livro.

Por fim, queria dividir com vocês o que sem sombra de dúvidas mais me emocionou no livro e me fez chorar copiosamente no meio de uma oficina mecânica - nem tentem imaginar a cena. Os conflitos de Isabel e Nate, pais de Auggie, sobre mandar o filho para a escola ou não. Os receios dele sofrer, o desejo de vê-lo trilhando seu caminho como um menino comum, o medo de errar. Acho que só um coração de mãe/pai pode ter dimensão do que tudo isso significa, e o meu se conectou completamente com os deles...

25 outubro 2019

Voltei!

5 anos.
5 anos! Na quase totalidade desse tempo tive certeza absoluta que jamais voltaria a escrever aqui. Não tirei o blog do ar porque tenho um carinho imenso por tudo que deixei aqui registrado, e porque sei que seu conteúdo pode ajudar muita gente por aí. Mas a sensação quase sempre era que não havia sentido em voltar...

Posso dizer que foi porque a filha parecia cansada dos livros, porque eu comecei a trabalhar demais, porque outros interesses me sugaram, mas sendo sincera, sei que embora tudo isso seja verdade, foram dois os principais motivos. O primeiro eu até já falei em um post aqui, que é o meu perfeccionismo (ou seria autosabotagem?). O texto tinha que surgir com uma inspiração maravilhosa, e se ela não vinha do jeito que eu idealizava, era melhor nem começar. E se começava ficava parado em busca desse ou daquele detalhe, às vezes uma frase, às vezes uma foto ou imagem. Então, quando um certo desgaste veio (e o que nessa vida não passa por desgaste com o tempo?) e a inspiração rareou, eu simplesmente não conseguia mais escrever, paralisada nos meus ideais de "perfeição".

O segundo motivo é que a exposição me incomoda. Eu viro e reviro, mas a verdade é que a exposição das redes sociais é um desafio enorme para mim. Uma relação de amor e ódio, sabe? Tenho tanto a falar, e tanta vontade de falar, mas temo me expor. Não é a toa que esse blog foi por dois anos um blog anônimo. De certa forma os dois motivos se entrelaçam, e falam muito sobre a minha insegurança, meu medo de não ser boa o suficiente. Sim, eu já fiz muita terapia kkkkk

Mas o fato é que alguma coisa mudou nestes últimos cinco anos. E gosto de pensar que, além de coisas práticas como a terapia, a meditação e outros esforços de autoconhecimento, tem algo com um peso enorme nisso tudo: a idade! Pois é, estou mesmo ficando velha, e junto com os fios grisalhos que eu adoro desfilar, tem surgido a sensação de que não tenho mais muito tempo para medos e inseguranças. Mais que isso, a sensação de que estou no melhor momento da minha vida! Veja só: ainda tenho vitalidade e força física, acredito que estou no auge da minha clareza mental, e já acumulo os benefícios que só as experiências e vivências nos dão. Não tem depois, a melhor hora é agora!

Por isso voltei! E embora seja uma pena que esses cinco anos já não possam ser resgatados, sei que ainda tenho muito a dizer sobre livros infanto-juvenis. Sim, porque talvez a mudança mais significativa que tive nesse período é que agora sou mãe de adolescente! Geeente! Quase treze anos e nem consigo acreditar nisso. Morro de saudades das bochechinhas e da vozinha infantil, mas morro de amores com essa menina que já calça os meus sapatos e prepara o jantar, e tem questionamentos e posicionamentos que me enchem de orgulho. Sim, claro que tem as birras e as chatices também, e os momentos de só querer seguir a manada, que me enlouquecem, mas a verdade é que tem sido incrível descobrirmos como viver esses papéis de mãe e filha nesse mundo misterioso da adolescência.

E é isso. Voltei. Ainda não sei como será, se vou conseguir ficar, se vou fugir novamente, se trarei mais livros infantis ou adolescentes (quem sabe adultos?), se manterei o formato de sempre trazer alguma história com a minha cachinhos (agora ela é uma adolescente, né gente? tenho que ter muito mais cuidado com a sua privacidade). Certo é que manterei o mesmo papo franco e o mesmo cuidado com o que recomendo e comento, o mesmo amor pelas palavras, e o mesmo carinho com quem me ler. Já estou preparando o texto para um livro mega especial para nós, e logo ele estará publicado.

Obrigada por estar aqui comigo. Mesmo que você não tenha cachinhos, mesmo que você nem goste tanto assim de ler, vai ficando... os livros infanto-juvenis podem te surpreender!

Fonte: pixabay.com